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Pesquisa mostra que, das pessoas com deficiência que empreendem 39% foram motivadas pela falta de oportunidades profissionais.
Uma pesquisa inédita no Brasil, que está sendo divulgada nesta semana, lança luz a uma questão fundamental para avançarmos na pauta da inclusão produtiva de pessoas com deficiência.
Conduzido pela economista Juliana Vanin, da NOZ Inteligência, e por uma coalizão de atores sociais, o levantamento Pessoas com Deficiência e Empregabilidade apresenta um panorama completo desta temática no País ao reunir análises qualitativa e quantitativa extraídas de 4.427 entrevistas, das quais, 3.730 são pessoas com deficiência e/ou transtorno do espectro autista.
Foram ouvidos cidadãos e cidadãs que residem em todos os Estados (nas capitais e no interior) e no Distrito Federal. O questionário contou, ainda, com uma versão em Libras, que ampliou a participação de pessoas com deficiência auditiva.
Embora o mapeamento apresente uma fotografia multidimensional do tema, gostaria de me ater a um pequeno recorte analítico focado no empreendedorismo de pessoas com deficiência. Do universo de 3.730 pessoas ouvidas para o mapeamento, somente 1,7% (61 indivíduos) declararam que são empreendedoras ou que estão em fase de planejar um negócio.
Em conversa com Juliana Vanin, ela me contou que três em cada dez pessoas dessa amostra de empreendedores iniciaram o negócio há menos de seis meses, 38% são microempreendedores individuais, 39% ainda não formalizaram a empresa, e sete em cada dez não têm funcionários, ou seja, atuam sozinhos.
Quase metade dos empreendedores (46%) declara que a empresa não teve faturamento nos últimos 12 meses. Sobre a motivação para empreender, 39% afirmaram que começaram na jornada empreendedora por falta de oportunidades profissionais.
O que a pesquisa mostra é que, embora a Lei de Cotas tenha sido um marco histórico para a inclusão produtiva de pessoas com deficiência no Brasil, o acesso efetivo a postos de trabalho e a oportunidades de desenvolvimento profissional -sobretudo no mercado formal — está condicionado a uma série de desafios sociais multifatoriais permeados por uma cultura que associa a pessoa com deficiência à incapacidade produtiva.
Além disso, há um forte componente de capacitismo estrutural no Brasil, ou seja, um preconceito que ganha corpo em uma discriminação explícita. Tudo isso, claro, agravado pelo contexto nacional de desemprego.
A pesquisa revela, inclusive, que 34,4% dos profissionais com deficiência estão desempregados. Desse montante, 31,3% dos entrevistados estão em busca de nova oportunidade e 3,1% não estão procurando recolocação profissional no momento.
Juliana diz que, ao analisar o desemprego em relação ao tipo de deficiência dos respondentes, temos:
- 34% dos profissionais desempregados têm deficiência física ou mobilidade reduzida;
- Entre as pessoas com deficiência visual, o índice de desemprego é 31%;
- Pessoas com deficiência auditiva são 38% dos entrevistados;
- 52% das pessoas com deficiência desempregadas têm deficiência intelectual ou mental;
- 52% das pessoas desempregadas têm deficiência psicossocial;
- Na análise dos entrevistados com transtorno do espectro autista, 39% das pessoas estão desempregadas no momento.
A leitura crítica desses dados qualificados pode auxiliar no fortalecimento e na criação/formatação de programas de apoio a empreendedores e empreendedoras com deficiência.
A inclusão produtiva, via geração de empregos ou apoio ao empreendedorismo, é fundamental para combatermos os danos gerados por uma sociedade capacitista que retira das pessoas com deficiência a possibilidade de elas desenvolverem plenamente suas habilidades, 00aptidões, capacidades e seus talentos.
* Maure Pessanha é empreendedora e presidente do Conselho da Artemisia, organização pioneira no apoio a negócios de impacto social no Brasil. Texto publicado originalmente no Estadão PME.
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