Com acesso a capital, negócios como Barkus e Estante Mágica endereçam questões financeiras e educacionais
Converse por menos de meia hora com qualquer pessoa que empreende e pergunte sobre quais são os principais desafios que enfrenta. Certamente, esse empreendedor ou essa empreendedora vai citar a dificuldade em acessar capital, sobretudo, o tal capital paciente. A barreira monetária permanece como um empecilho para, por exemplo, o negócio ganhar escala e amplificar o impacto social. Ou seja, transformar positivamente a vida de muitas pessoas que podem se beneficiar do produto ou serviço desenvolvido por essa empresa.
Ao acompanhar os desafios enfrentados pelos líderes de negócios de impacto, a Artemisia — organização pioneira no Brasil no fomento e na aceleração de negócios de impacto — aprofundou a compreensão de que deve consolidar o próprio papel para transformar o capital em alavanca para o crescimento de grandes soluções.
De trava para alavanca, o investimento articulado precisa impulsionar essa nova lógica de apoio ao empreendedor fomentando uma jornada capaz de potencializar o impacto na sociedade. Afinal, no cerne da questão, o importante são as pessoas que serão beneficiadas pela inovação social.
Recentemente, ouvi uma frase que me tocou bastante: “Empreendedorismo não é somente uma forma de as pessoas ganharem dinheiro, é uma atividade que dá a oportunidade de modificarem as suas vidas e a de outras pessoas”.
Para tornar mais tangível a importância de destravar o capital em prol dos negócios de impacto, trago dois exemplos — Barkus e Estante Mágica — que mostram a potência que o investimento tem quando há disponibilidade de apoiar a construção de futuros mais inclusivos, diversos e com reais oportunidades para as pessoas em situação de vulnerabilidade social.
Ambos foram os primeiros negócios de impacto selecionados para receber os investimentos via financiamento de longo prazo, em uma articulação da Artemisia com Elie Horn. O primeiro case é da Barkus, fundada por Bia Santos e Marden Rodrigues com o objetivo de democratizar o ensino de finanças com o uso da tecnologia.
No Brasil, estamos longe de ser uma nação com educação financeira: 63 milhões de cidadãos têm conta em atraso, ou seja, aproximadamente 40% da população adulta, segundo Serasa Experian (2021). Mais da metade dos trabalhadores diz, inclusive, que finanças é a principal preocupação, o que mostra o quanto o tema impacta diversos âmbitos da vida, de acordo com a PwC.
Neste contexto, a empresa usa metodologias autorais para alcançar o maior número de pessoas dispostas a mudar o próprio comportamento financeiro. A solução oferece cursos de capacitação financeira por meio da Iara: chatbot que funciona via WhatsApp e tem por base uma inteligência artificial que opera de forma individualizada, personalizada, automatizada e humanizada.
Das 100 mil pessoas que obtiveram acesso às ferramentas do negócio de impacto, 75 mil foram beneficiadas graças ao capital recebido. Com o investimento adquirido, os empreendedores puderam aumentar o time de tecnologia e vendas, além de obter capital de giro necessário para ganhar fôlego no crescimento, validar o modelo de receita e gerar mais vendas.
A Estante Mágica, fundada por Robson Melo e Pedro Concy, cuja história já contei em uma coluna anterior, é o segundo exemplo. Na perspectiva do problema que o negócio se propõe solucionar, cabe pensar que o sistema de educação básica no Brasil ainda apresenta falhas e forma um grande contingente de pessoas sem as habilidades básicas para leitura e interpretação de textos.
Em 2021, o PISA apontou que dez em cada 25 crianças brasileiras não sabiam ler e escrever. Outro dado a ser considerado é que apenas 52% da população, pouco mais da metade dos cidadãos, têm o hábito da leitura, de acordo com a pesquisa Retratos da leitura no Brasil (2020). Esse levantamento aponta que o hábito de ler é menos presente entre as classes C, D e E.
Para endereçar uma solução para esse problema, o negócio de impacto social tem como proposta transformar crianças (alunos de escolas públicas e privadas) em protagonistas de suas próprias histórias. Na prática, estimula a leitura e a escrita, convidando alunos e alunas a escreverem seus primeiros livros.
Com o investimento articulado pela Artemisia, dos mais de 355 mil alunos que escreveram suas histórias por meio da trilha educacional da empresa (entre abril e novembro de 2022), aproximadamente 47 mil tiveram acesso ao projeto devido ao empréstimo concedido. Nessas duas histórias, o ponto comum é a comprovação de que o investimento correto pode potencializar o impacto social trazido por empreendedores e empreendedoras do Brasil. Pensar no capital sob esse prisma é essencial para alavancarmos os negócios que estão transformando o País.
- Maure Pessanha é empreendedora e presidente do Conselho da Artemisia, organização pioneira no apoio a negócios de impacto social no Brasil. Texto original publicado no Blog do Empreendedor — Estadão PME.