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Criar equipes multidisciplinares, com diversidade econômica, racial, de gênero e social é a dica para quem vai iniciar uma jornada empreendedora
A população brasileira mais vulnerável economicamente vive em uma situação de escassez financeira que causa obstáculos à tomada de decisões adequadas, fazendo com que a constante preocupação em resolver emergências cotidianas torne mais difícil planejar decisões de longo prazo. Estudos de psicologia econômica — que têm medido o impacto dessa condição na capacidade de as famílias de menor renda fazerem melhores escolhas — mostram o desafio de construir uma arquitetura de decisão que direcione o usuário de serviços financeiros para atitudes que resultem em bem-estar econômico.
Os desafios de grande parte da população para o acesso e uso com qualidade de serviços financeiros apontam oportunidades para empreender fintechs de impacto social, que podem endereçar os desafios de forma escalável e gerar alto impacto positivo no setor. Uma das formas é adaptar os serviços já existentes, corrigindo as barreiras e dificuldades de uso para as pessoas em situação de vulnerabilidade econômica; simplificar produtos de entrada — redesenhar soluções para melhorar a arquitetura de escolha, a partir do profundo conhecimento do público-alvo –; e adequar a linguagem para que o consumidor assimile os benefícios do produto e tenha confiança no serviço.
As oportunidades de criar soluções de base tecnológica e que gerem alto impacto social existem e são concretas; têm, também, o apoio de uma regulamentação favorável que estimula a inovação. Há muito espaço para o desenvolvimento de produtos e serviços éticos voltados à real cidadania financeira. É possível usar a inteligência da economia e da psicologia — com forte viés comportamental — para vencer a desconfiança do consumidor brasileiro e apoiá-lo a tomar melhores decisões. Soluções que conversem com o público feminino são, também, mais que bem-vindas.
De modo geral, a janela de oportunidades está aberta para empreendedores de impacto social inovadores e conectados com a causa de levar produtos financeiros que tragam educação e inclusão financeira. Uma recomendação que faço aos que vão iniciar uma jornada empreendedora é que criem times multidisciplinares e diversos. As fintechs, de modo geral, têm times mais ‘tech touch’ e com pouca diversidade econômica, racial, de gênero e social nas equipes. Para criar melhores produtos de impacto, precisamos de equipes mais diversas. Entre as oportunidades de empreender detectadas pela Tese de Impacto Social em Serviços Financeiros, destaco as soluções para o aumento da digitalização, construção de histórico para crédito, produtos que constroem confiança e produtos que empoderam o usuário para escolhas financeiras conscientes.
O baixo uso de soluções digitais e a queda do número de correspondentes bancários — principal porta de acesso à população de menor renda — apontam para a primeira oportunidade: aumento da digitalização. A escalabilidade proporcionada pela digitalização tem o potencial de reduzir os custos de aquisição de clientes e os custos de transação, tornando os serviços das fintechs mais acessíveis e atraentes para usuários. São exemplos de soluções: contas digitais que usem tecnologia para oferecer transparência e serviços sem custo ao usuário e parcerias com cooperativas de crédito que atendam aos empreendedores de menor renda para capilaridade e menor custo de aquisição. O aumento da digitalização também tem potencial de melhorar o acesso a crédito adequado para o público mal servido pelo atual sistema financeiro. São exemplos de soluções a adaptação de serviços de crédito para especificidades do público e facilitação do direcionamento de recursos do microcrédito.
A população de baixa renda não bancarizada — ou que faz pouco uso dos serviços financeiros — não consegue acessar crédito por não ter histórico construído em instituições financeiras. Diante desse desafio, surge a segunda oportunidade: o uso de dados não estruturados para construção de histórico para essa parcela da população. São exemplos as startups que não se entendem como fintechs — oriundas de outros setores — mas, que possuem meios de pagamento nos serviços oferecidos, gerando histórico de recebimento e inadimplência (como aplicativos para motoristas particulares) e soluções com uso de dados não estruturados para construção de histórico que apoiem a análise de concessão de crédito.
A desconfiança, além da preferência por pagamentos em espécie, gera pouco uso dos serviços financeiros. A oportunidade número três propõe criar confiança por meio da simplificação de produtos financeiros de entrada que quebrem as barreiras entre o usuário e os serviços financeiros, a partir de um conhecimento aprofundado do público. São exemplos os serviços financeiros de entrada com fácil usabilidade e comunicação simples e transparente — que quebrem barreiras para adoção de outros serviços financeiros (conta, seguro, investimento, cartão de crédito, cartão pré-pago) — serviços com foco local na comunicação e solução, que geram identificação e pertencimento com a população das comunidades em situação de vulnerabilidade econômica e serviços com atendimento híbrido (presencial e online), que criam confiança com o usuário no contato presencial para apoio no uso da solução digital.
Muitos dos problemas financeiros enfrentados pela população são ocasionados pela falta de entendimento dos serviços e informações pouco claras que geram escolhas não conscientes ou saudáveis. A quarta oportunidade — produtos que empoderam o usuário para escolhas conscientes — propõe o uso de arquitetura de escolha (nudges, da economia comportamental) que apoie o bom uso dos serviços e decisões mais conscientes, melhorando aspectos de poupança, planejamento e tomadas de créditos.
A cultura empreendedora tem avançado no Brasil e revelado uma nova geração de empreendedores que transformam os desafios sociais em inclusão por meio de produtos e serviços financeiros que resolvem as dores da população mais vulnerável economicamente. Nos quatro cantos do país há empreendedores interessados em transformar a realidade de escassez com inovação.
Você pensa em empreender no setor de Serviços Financeiros para gerar impacto positivo em nossa sociedade? Conheça nossa Tese de Impacto Social em Serviços Financeiros — estudo que criamos em parceria com Aspen Network of Development Entrepreneurs e MetLife Foundationque analisa os principais desafios enfrentados pela população de baixa renda e aponta as oportunidades para quem pensa em criar um negócio de impacto social no setor. Faça o download gratuito AQUI.
Maure Pessanha é coempreendedora e diretora-executiva da Artemisia, organização pioneira no fomento e na disseminação de negócios de impacto social no Brasil.
Texto publicado originalmente no Blog do Empreendedor — Estadão PME.
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Criar equipes multidisciplinares, com diversidade econômica, racial, de gênero e social é a dica para quem vai iniciar uma jornada empreendedora
A população brasileira mais vulnerável economicamente vive em uma situação de escassez financeira que causa obstáculos à tomada de decisões adequadas, fazendo com que a constante preocupação em resolver emergências cotidianas torne mais difícil planejar decisões de longo prazo. Estudos de psicologia econômica — que têm medido o impacto dessa condição na capacidade de as famílias de menor renda fazerem melhores escolhas — mostram o desafio de construir uma arquitetura de decisão que direcione o usuário de serviços financeiros para atitudes que resultem em bem-estar econômico.
Os desafios de grande parte da população para o acesso e uso com qualidade de serviços financeiros apontam oportunidades para empreender fintechs de impacto social, que podem endereçar os desafios de forma escalável e gerar alto impacto positivo no setor. Uma das formas é adaptar os serviços já existentes, corrigindo as barreiras e dificuldades de uso para as pessoas em situação de vulnerabilidade econômica; simplificar produtos de entrada — redesenhar soluções para melhorar a arquitetura de escolha, a partir do profundo conhecimento do público-alvo –; e adequar a linguagem para que o consumidor assimile os benefícios do produto e tenha confiança no serviço.
As oportunidades de criar soluções de base tecnológica e que gerem alto impacto social existem e são concretas; têm, também, o apoio de uma regulamentação favorável que estimula a inovação. Há muito espaço para o desenvolvimento de produtos e serviços éticos voltados à real cidadania financeira. É possível usar a inteligência da economia e da psicologia — com forte viés comportamental — para vencer a desconfiança do consumidor brasileiro e apoiá-lo a tomar melhores decisões. Soluções que conversem com o público feminino são, também, mais que bem-vindas.
De modo geral, a janela de oportunidades está aberta para empreendedores de impacto social inovadores e conectados com a causa de levar produtos financeiros que tragam educação e inclusão financeira. Uma recomendação que faço aos que vão iniciar uma jornada empreendedora é que criem times multidisciplinares e diversos. As fintechs, de modo geral, têm times mais ‘tech touch’ e com pouca diversidade econômica, racial, de gênero e social nas equipes. Para criar melhores produtos de impacto, precisamos de equipes mais diversas. Entre as oportunidades de empreender detectadas pela Tese de Impacto Social em Serviços Financeiros, destaco as soluções para o aumento da digitalização, construção de histórico para crédito, produtos que constroem confiança e produtos que empoderam o usuário para escolhas financeiras conscientes.
O baixo uso de soluções digitais e a queda do número de correspondentes bancários — principal porta de acesso à população de menor renda — apontam para a primeira oportunidade: aumento da digitalização. A escalabilidade proporcionada pela digitalização tem o potencial de reduzir os custos de aquisição de clientes e os custos de transação, tornando os serviços das fintechs mais acessíveis e atraentes para usuários. São exemplos de soluções: contas digitais que usem tecnologia para oferecer transparência e serviços sem custo ao usuário e parcerias com cooperativas de crédito que atendam aos empreendedores de menor renda para capilaridade e menor custo de aquisição. O aumento da digitalização também tem potencial de melhorar o acesso a crédito adequado para o público mal servido pelo atual sistema financeiro. São exemplos de soluções a adaptação de serviços de crédito para especificidades do público e facilitação do direcionamento de recursos do microcrédito.
A população de baixa renda não bancarizada — ou que faz pouco uso dos serviços financeiros — não consegue acessar crédito por não ter histórico construído em instituições financeiras. Diante desse desafio, surge a segunda oportunidade: o uso de dados não estruturados para construção de histórico para essa parcela da população. São exemplos as startups que não se entendem como fintechs — oriundas de outros setores — mas, que possuem meios de pagamento nos serviços oferecidos, gerando histórico de recebimento e inadimplência (como aplicativos para motoristas particulares) e soluções com uso de dados não estruturados para construção de histórico que apoiem a análise de concessão de crédito.
A desconfiança, além da preferência por pagamentos em espécie, gera pouco uso dos serviços financeiros. A oportunidade número três propõe criar confiança por meio da simplificação de produtos financeiros de entrada que quebrem as barreiras entre o usuário e os serviços financeiros, a partir de um conhecimento aprofundado do público. São exemplos os serviços financeiros de entrada com fácil usabilidade e comunicação simples e transparente — que quebrem barreiras para adoção de outros serviços financeiros (conta, seguro, investimento, cartão de crédito, cartão pré-pago) — serviços com foco local na comunicação e solução, que geram identificação e pertencimento com a população das comunidades em situação de vulnerabilidade econômica e serviços com atendimento híbrido (presencial e online), que criam confiança com o usuário no contato presencial para apoio no uso da solução digital.
Muitos dos problemas financeiros enfrentados pela população são ocasionados pela falta de entendimento dos serviços e informações pouco claras que geram escolhas não conscientes ou saudáveis. A quarta oportunidade — produtos que empoderam o usuário para escolhas conscientes — propõe o uso de arquitetura de escolha (nudges, da economia comportamental) que apoie o bom uso dos serviços e decisões mais conscientes, melhorando aspectos de poupança, planejamento e tomadas de créditos.
A cultura empreendedora tem avançado no Brasil e revelado uma nova geração de empreendedores que transformam os desafios sociais em inclusão por meio de produtos e serviços financeiros que resolvem as dores da população mais vulnerável economicamente. Nos quatro cantos do país há empreendedores interessados em transformar a realidade de escassez com inovação.
Maure Pessanha é coempreendedora e diretora-executiva da Artemisia, organização pioneira no fomento e na disseminação de negócios de impacto social no Brasil.
Texto publicado originalmente no Blog do Empreendedor — Estadão PME.
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