Empreendedores de negócios sociais devem pensar grande em relação ao impacto social e, ao mesmo tempo, ficar de olho nos resultados.
Problemas complexos exigem soluções igualmente complexas. Essa é a máxima das organizações sociais. Entretanto, no mundo dos negócios, há uma outra máxima – a de que a simplicidade é a chave para o sucesso. Você possui um produto que um cliente compra, de forma a obter lucro na transação. Simples assim. Então, como aliar a complexidade de um problema social à simplicidade necessária para fazer negócios?
O primeiro passo é descobrir se você está perseguindo o verdadeiro problema. No artigo passado, escrevi sobre a importância de identificar gambiarras, ou seja, aquilo que o consumidor teria como alternativa se a empresa não existisse.
Quando a gambiarra é corretamente identificada, o próximo desafio passa a ser construir uma proposta de valor pragmática. Parece simples, mas na prática os empreendedores de negócios sociais tendem a criar propostas de valor que pecam em dois aspectos: são idealistas demais e não definem quem é o seu cliente.
Propostas de valor idealistas são aqulas do tipo “é bom para o meio ambiente” ou “é um produto justo e solidário”, que nada dizem sobre os benefícios gerados para aquele que compra. Quanto menos tangível for sua proposta de valor, maior será o investimento em comunicação necessário para conquistar clientes.
Mesmo assim, a chance de esse produto permanecer em um mercado de nicho e pouco escalável é grande. Um exemplo é o mercado de placas solares. Mesmo após anos de desenvolvimento no país, elas ainda são um produto de nicho, destinado principalmente para residências de alta renda e aquecimento de piscinas. Sua proposta de valor – ser um produto mais sustentável – é muito fraca para que as pessoas desembolsem uma quantia considerável para obter algo que elas já possuem.
Uma proposta de valor pragmática é aquela que identifica muito bem o cliente a ser servido e oferece uma solução com benefício claros e mensuráveis. Um exemplo de sucesso é o caso da Selco, um negócio social baseado na Índia que também oferece placas solares.
A diferença é que, desde o primeiro dia, o empreendedor pensou em uma solução que funcionasse para os 2 bilhões de pessoas que não têm nenhum acesso à energia elétrica. Essas pessoas consomem luz por meio de uma gambiarra: compram e queimam diesel e querosene todos os dias, uma solução perigosa, que gera problemas graves de saúde, pois o combustível é queimado dentro das casas.
A Selco tem uma proposta de valor simples. Oferece soluções de iluminação interna, externa e portátil por meio de tecnologia solar para clientes que não possuem energia elétrica. Os clientes financiam o produto por meio de uma espécie de leasing, com pagamentos semanais, mensais ou semestrais, dependendo do perfil de renda.
Se for um comerciante, por exemplo, o pagamento é semanal. Se for um trabalhador rural, o pagamento é semestral, pois sua renda varia conforme a sazonalidade da plantação. O valor dos pagamentos é calculado de acordo com o montante total que a pessoa já gastava com as gambiarras, como a querosene (um gasto que pode chegar a 40% da renda).
A Selco já atendeu a 200 mil famílias. É um negócio que emprega 224 pessoas e acaba de receber um investimento de risco de US$ 5 milhões para expandir suas operações para o Vietnã e o Sri Lanka.
O caso da Selco exemplifica como um empreendedor pode ser um idealista pragmático. Na ARTEMISIA, acreditamos que, para criar negócios que rompam com os padrões precedentes, é necessário ter uma geração de empreendedores que pensam grande e genuinamente com relação ao impacto social e, ao mesmo tempo, são pragmáticos com os resultados.
*Artigo publicado originalmente no site da Pequenas Empresas & Grandes Negócios